Sábado, 20 Abril 2024

Vi um quadro de Turner pela primeira vez no Masp, em São Paulo, durante a exposição "Romantismo: a arte do entusiasmo" (“Chuva, neblina, cais e navios”, Porto Literário, 06/04/2010). O quadro era “O Castelo”, do acervo do museu, o que permite a milhões de brasileiros sentir o impacto da pintura desse autor em nossas vistas.

Turner (1775-1851) é um pintor ainda romântico no espírito mas já impressionista na execução. Ao invés das paisagens campestres que caracterizam o romantismo inglês, Turner volta os olhos para o mar, para seus ventos e tempestades. Nesse cenário, um tema épico como a navegação sob tormenta é representado não pelo traço realista que mimetiza a bucólica paisagem do interior da Inglaterra, mas por uma mão impressionista que dispõe cores, luzes, sombras e movimento. Daí o subtítulo de “J.M.W. Turner 1775-1851: The World of Light and Colour” (O Mundo de Luz e Cor), onde o autor, Michel Bockemühl, afirma “mesmo hoje, suas últimas pinturas podem dar ao observador um sentido de ver o mundo pela primeira vez – um mundo de cor e luz”.

E.H. Gombrich, o grande historiador da arte, afirma: “Turner (...) teve visões de um mundo fantástico, banhado de luz e resplendores de beleza; mas, em vez de calmo, o seu era um mundo cheio de movimento, em vez de harmonias singelas, exibia aparatoso deslumbramento”.

Ainda na apresentação da edição da Taschen (editora alemã especializada em livros sobre arte), o autor porém faz um aviso (verdadeiro, infelizmente): “O trabalho de Turner não pode ser reproduzido. Mesmo as melhores impressões apenas servem para despertar a curiosidade pelo original. O sentido fundamental ligado tanto com as nuances de cor e estrutura quanto com as pequenas diferenças entre os traços de lápis ou pincel, se pronunciados ou meramente aplicadas com brevidade, é particularmente incrível no contexto da arte de Turner”.

Isso é algo que percebemos em “Rain, Steam and Speed – The Great Western Railway” (Chuva, Vapor e Velocidade – A Grande Ferrovia do Oeste”, 1844).

Por melhor que seja a reprodução, podemos adivinhar o que perdemos ao não ver o original, na National Gallery, em Londres. Não é porque conseguiríamos ver mais partes do trem, ou com mais exatidão a plataforma ou qualquer outro objeto sugerido no quadro. Na verdade, o original entrega o que o título promete e nos envolve em chuva e vapor. Mas não chuva e vapor de impressões realistas, mas com a força moral e expressiva do romantismo.
 
Por isso, se estiverem passando por ali, na Avenida Paulista, entre o Paraíso e a Consolação, vale refletir se não vale uma entradinha no Masp (às terças é de graça) e ficar 20 minutos da hora do almoço na frente de “O Castelo”, o que, no fundo, vale para qualquer outra obra-prima de qualquer museu deste mundo de baixos níveis de concentração.

Referências
Michael Bockemülh. J.M.W. Turner 1775-1851: The World of Light and Colour. Colônia, Alemanha: Taschen, 2010 (1ª ed. 1991).

E.H. Gombrich. A História da Arte. Tradução Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: LTC, 2009 (edição original 1950).

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