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II A paisagem na poesia
O mistério do mar e a distinção da montanha. Por isso, retomo aqui o poeta peruano Javier Heraud (1942-1963), que tenho traduzido aos poucos neste Porto Literário. Na parte 4 de seu longo poema dedicado ao outono, “À espera do outono”, Heraud usa os dois elementos para descrever a expectativa pela chegada da estação:
4
Estou à espera do outono.
Agora que tudo parece desmoronar
estou esperando pelo outono,
depois viajaremos pelos mares,
agora estou à espera do outono,
depois assinalaremos os culpáveis,
estou esperando pelo outono,
mais adiante conhecerei as montanhas ignoradas,
tem que se aproximar já o outono,
depois pensaremos nos reinos arruinados,
agora estou à espera do outono,
em outro momento leremos os poemas esquecidos,
em outro momento as cartas recebidas,
depois escreverei os dias do verão,
depois os dias do inverno.
Agora e sempre,
como todos os anos
na mesma época do ano,
agora e sempre,
estou à espera do outono,
do mesmo eterno outono,
do outono das árvores,
do outono das luzes,
do outono das casas e das flores.
Agora e sempre,
estamos esperando pelo outono,
estamos à espera do outono,
esperando pelo outono,
à espera do outono,
do mesmo outono.
Talvez seja um turvamento causado pela leitura, mas a música e o encadeamento dos versos de Heraud não sugerem uma névoa verbal equivalente à da paisagem de Turner?
Referências
Jorge Luis Borges. Sobre a amizade e outros diálogos. Organização e tradução: John O’Kuinghttons. São Paulo: Hedra, 2009.
Javier Heraud. En espera del otoño. In: Estación Reunida (Lima, 1961). In: Poesía Reunida. Lima, Peru: Peisa, 2010.