Quarta, 24 Abril 2024

escrito por André de Seixas, criador e editor do site dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro

Em 14 de julho de 2014 foi realizada na Unidade Administrativa da ANTAQ no Rio de janeiro a primeira reunião da Agenda Positiva estabelecida entre o órgão regulador e os usuários. Os usuários exportadores e importadores foram representados pelo UPRJ, pela USUPORT Bahia, através do Diretor Executivo Paulo Villa; pela USUPORT-SC, através do Advogado Osvaldo Agripino e; Pela CECAFE, através do Diretor Administrativo e Financeiro Ronaldo Taboada. Também se fez presente à primeira reunião da Agenda Positiva a Federação Nacional dos Auditores e Fiscais de Tributos Municipais – FENAFIM, através de seu Presidente Carlos Cardoso Filho e de sua Diretora de Comunicação Ana Paula Simonelli.

Da parte da ANTAQ estiveram presentes os 03 Diretores, o Superintendente de Navegação Marítima e Apoio, o Superintendente de Portos e o Gerente de regulação de Portos, o Superintendente de Fiscalização e uma Servidora da ANTAQ Rio de Janeiro.

A primeira reunião serviu para que todos os participantes fossem apresentados, bem como delineado o trabalho da Agenda Positiva e as prioridades fossem colocadas, de forma que as próximas reuniões sejam focadas em cada tema da pauta. Nesse sentido, foi estabelecido pela Diretoria da ANTAQ que as reuniões continuarão a acontecer periodicamente (serão perenes), sem que exista um intervalo grande entre elas, no máximo 45 dias entre uma e outra, de forma que os usuários sejam acolhidos pela Agência, reduzindo e enorme assimetria de representação hoje existente. A próxima reunião está pré-agendada para última semana de agosto e acontecerá em Brasília –DF, vez que o Diretor-Geral da ANTAQ confirmou sua presença no II Fórum Brasileiro dos Usuários de Portos (Usuportos), que acontecerá em 11 de agosto na cidade Rio de Janeiro.

Apesar de louvarmos essa atitude inédita da Diretoria da ANTAQ em acolher os usuários na Agência que, sem sombra de dúvidas, será de grande importância para a competitividade do comércio exterior brasileiro, os usuários ainda estão céticos quanto às mudanças que venham, efetivamente, trazer para a regulação setorial os que estão fora dela, em cumprimento ao marco regulatório. Por isso, ainda que estejamos dentro dessa Agenda Positiva, foi definido que os processos que correm junto ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União permanecerão como estão, correndo de forma independente, continuando a serem alimentados na defesa dos interesses dos usuários, sendo certo que as efetivas mudanças positivas que ocorrerem serão devidamente comunicadas.

Ficou estabelecido que o foco inicial da Agenda Positiva será a Regulação dos Armadores Estrangeiros. Para os usuários presentes, trata-se da mais relevante inovação regulatória do setor, sem a qual, o nível de letalidade da falta de regulação econômica do armador estrangeiro nos custos logísticos dos importadores e exportadores jamais será reduzido. A ANTAQ ainda tem certa resistência quanto à necessidade Constitucional das Outorgas de Autorização, por uma interpretação do jurídico da Agência, fato que discordamos veementemente, pois entendemos que se trata de Competência Exclusiva da União sobre questões estratégicas para a soberania do Brasil, amplamente exposto no UPRJ através de diversos artigos e já efetuado em vários países e demais modais quando se trata de transporte aéreo internacional de cargas, como o aéreo (ANAC), ferroviário e rodoviário (ANTT).

Todavia, é importante destacar que, embora tenha esse entendimento, a Diretoria da Agência vê que existe sim a necessidade de registrar os armadores estrangeiros e as suas embarcações, o que significa uma grande evolução para o setor.

O tema omissões de portos (mais de 300 ocorrências em 2013 no Brasil) surgiu com toda força na reunião, pois evidencia a falta de ordenamento do nosso tráfego aquaviário na navegação de longo curso, que hoje é feita pelas empresas estrangeiras de navegação e que estão ilegais no Brasil, como o caso das empresas Maersk Line e MSC (M2), por exemplo. Essas duas gigantes do setor, que acabaram de anunciar uma aliança, tendo em vista a proibição pela China de operar o joint com a CMA-CGM (P3), sequer poderiam estar operando no Brasil por conta da falta de acordo entre o Brasil, seus países sedes e países de registros das embarcações, nos termos da Lei 9.432/97 e da Constituição Federal.

Além de evidenciar o problema do ordenamento da navegação de longo curso, as omissões de portos, foram responsáveis por manchar a imagem do Brasil no exterior, por enormes prejuízos a exportadores e importadores e por verdadeiros colapsos nos terminais portuários brasileiros, alavancando de forma grotesca a taxa de ocupação dos pátios, provocando diversos problemas operacionais aos usuários.

Pesa, sobremaneira, o fato de que os armadores, cujos navios omitiram e atrasaram escalas, recusaram-se a pagar aos operadores portuários as armazenagens de exportação, contrariando a Resolução Antaq 2.389/12, e ainda recusaram-se a ressarcir importadores com as despesas de transporte de cargas deixadas em outros portos de destino, diferente daqueles pactuados no contrato de transporte.

Cabe salientar que, o fato de os terminais terem sofrido colapsos por conta das centenas de omissões de portos, não serve de excludente de responsabilidade para as empresas operadoras portuárias, pois essas são responsáveis por manter as taxas de ocupação de seus pátios em níveis toleráveis e seguros, de forma que os usuários tenham a garantia da boa prestação de serviços. Isso não ocorreu e também foi colocado por nós durante a reunião!

Foi apresentado por um dos participantes um exemplo claro de que os armadores estão se aproveitando, e muito, da falta de ordenamento da nossa navegação de longo curso, descontando no Brasil, até mesmo, os atrasos sofridos pelos seus navios em portos do exterior e que, ainda assim, estão se recusando a pagar as armazenagens de exportação aos terminais e que esses continuam a cobrar a conta dos exportadores. Um verdadeiro desrespeito aos usuários e ao Brasil.

Ainda no tocante ao ordenamento do nosso tráfego marítimo na navegação de longo curso, destacamos que o mercado e a mídia, de maneira geral, focam muito nas mega carriers do segmento de containers e esquecem-se do mercado tramp, que opera no Brasil com navios que sequer podem tocar águas dos Estados Unidos e da Europa por questões de segurança, tendo em vista o enorme risco ambiental da sua operação. São verdadeiras latas velhas que tocam nosso mar territorial e nossos portos, pertencentes a empresas de mala, que sequer poderiam estar trabalhando no Brasil.

Também foram tratadas as cobranças realizadas pelos armadores estrangeiros através de seus bills of lading, que não detêm natureza de documento fiscal, assim como incluem diversas cláusulas abusivas, dentre as quais as de foro, lei aplicável e exoneração da responsabilidade civil. Na questão tributária, a presença da FENAFIM se faz necessária, pois os auditores fiscais das prefeituras de municípios portuários estão apurando os valores dos créditos devidos e medidas para recuperar ISS eventualmente sonegados, incluindo todas as surcharges, inclusive cobrança pelo terminal e armador (duas vezes) de preço ISPS Code, com destaque ao THC, cujos ressarcimentos das quantias pagas aos operadores portuários pelos armadores, nos termos da Resolução Antaq 2.389/12, jamais foram comprovados aos usuários que deveriam, no mínimo, receber dos armadores as notas fiscais dos terminais, atestando a lisura da operação financeira. Nesse sentido, foi discutida também a possibilidade de montagem de cesta de serviços, inflando o THC a partir da redução de valores de outros serviços, tornando a fiscalização do ressarcimento do THC impossível de ser fiscalizada de regulada.

Além das questões tributárias e de dividas, o THC também foi tratado sob a ótica concorrencial sendo que os usuários defendem que o THC será responsável por capturar para os armadores toda e qualquer possibilidade de concorrência entre os terminais, sendo um dos fatores responsáveis por fazer minguar a reforma portuária que visa aumentar a disponibilidade de terminais para os usuários.

Também foi discutido o tratamento não isonômico que apenas favorece a armação estrangeira em detrimento da brasileira, vez que estrangeiros não regulados, que usam e abusam da falta de fiscalização, levarão sempre vantagens sobre aqueles que são fiscalizados e exigidos. Hoje, para se tenha uma ideia, no segmento de containers, temos apenas três armadores nacionais operando no longo curso, sendo dois deles controlados por mega carriers estrangeiras, enquanto mais de 20 estrangeiros trabalham com toda liberdade, e sem um documento sequer que possibilitem suas operações no Brasil. Atualmente, sequer conseguimos fiscalizar se a nossa cabotagem está sendo executada por navios de bandeira brasileira, nos termos da lei, nas operações de feeder service, uma provável crime de descaminho. Denúncias já chegaram ao UPRJ informando que existem navios estrangeiros fazendo feeder service.

Foram tratados temas de regulação sobre os fretes, para os quais defendemos a existência de um cadastro de controle de preços a ser feito pela ANTAQ, objetivando o controle mínimo de mercado e a defesa da concorrência. Tratamos também e no mesmo sentido, das surcharges, das demurrages e dos câmbios abusivos praticados pelos armadores, que são bem acima do oficial.

As questões dos aumentos abusivos dos terminais foram colocadas à mesa. Defendemos que sejam cumpridos os preceitos legais para que existam reajustes e revisões de tarifas e que os aumentos dos preços tenham modicidade e sejam fiscalizados pela autarquia e pelo CADE. Foi mencionado o caso da LIBRA RIO como o mais emblemático, talvez o maior de toda história portuária brasileira, que chegou a 490% no 4° período, além dos terminais Portonave e APM Terminals em Itajaí que produziram aumentos abusivos.

As questões portuárias serão tratadas no decorrer das reuniões, até porque, segundo a Diretoria da ANTAQ informou, diversos estudos estão sendo feitos sobre o tema. Aguardaremos por esses estudos, afim de que possamos alinhá-los perfeitamente com os anseios dos usuários, que giram em torno de eficiência na prestação de serviços, fim de cobranças abusivas por parte dos terminais, modicidade de tarifas e preços e fiscalização.

Enfim, foi uma primeira reunião extremamente proveitosa. Todos que foram convocados sentiram que a atual Diretoria da ANTAQ está realmente com vontade de abraçar os usuários e trazê-los para dentro da Agência. É importantíssimo destacar que isso é algo inédito na ANTAQ, desde a sua criação, e que todos os usuários, de alguma forma, devem se sentir valorizados com essa atitude. Se, os usuários estão céticos quanto aos resultados dessa Agenda, principalmente quanto às reduções de assimetrias de representatividade, ao mesmo tempo, é extremamente importante que absolutamente todos confiem e apoiem essa nova diretoria e o trabalho que ela pretende realizar junto aos usuários.

Por fim, é importante deixarmos claro que não é intenção dessa Agenda suprimir direitos de armadores e terminais. Primamos pelo respeito, todavia, sabemos que o mero cumprimento da lei incomodará a muitos do lado de lá, principalmente a armação estrangeira que hoje é totalmente marginal ao nosso ordenamento jurídico, seja na regulação social, seja na regulação econômica.

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