Terça, 30 Abril 2024

No final de janeiro a Secretaria de Cultura de Santos (Secult) vai trocar a Biblioteca Municipal Alberto Sousa de prédio. Na ocasião, os 31 mil volumes deixam a Rua Amador Bueno para ganhar nova casa, ainda que provisória, no térreo da Sociedade Humanitária, na Praça José Bonifácio, que já mantém um acervo de 40 mil volumes em sua própria biblioteca. Para o Porto Literário, o destino da biblioteca servirá de medida para traçar a importância dos livros em nossa cidade, que se orgulha tanto de sua história.

 

I

Dois jornais de Santos publicaram no final de semana reportagens sobre o assunto. O Jornal da Orla, de leitura de final de semana, deu a principal manchete para o assunto e ressalta a união dos dois acervos em um único prédio. A belíssima foto de Leandro Amaral mostra uma prateleira com livros de lombadas encadernadas com couro e, ao fundo, uma pesquisadora ou visitante consulta uma outra estante, entre o primeiro plano e o segundo plano, o chão de tacos escuros e brilhantes da Biblioteca da Humanitária. A manchete – Todos os livros – e o título – Bibliotecas reúnem mais de 70 mil títulos no Centro de Santos – vêem com bons olhos a reunião dos dois conjuntos.

 

O repórter Eugênio Martins Júnior entrevista o responsável pela Coordenadoria de Informação e Centro Culturais de Secult, Jamir Ferreira Lopes. Ele diz à reportagem que a união dos acervos vai integrar os públicos que costumam freqüentar os dois espaços, os estudantes que realiza pesquisas escolares na Municipal e os pesquisadores que buscam os documentos e obras históricas da Humanitária. Tomara que mais à frente a secretaria anuncie como vai realizar a integração para além do vai-e-vem pelos corredores do prédio. Boa novidade é o anúncio de acesso para portadores de necessidades especiais mas, ainda que importante e necessário, este não é um assunto literário.

 

II

Já a matéria do diário A Tribuna – Biblioteca Pública vai mudar para a Sociedade Humanitária (só para assinantes, o que é terrível) – não tem assinatura, é “Da Redação” (pelo menos no site, onde a estou consultando). Ela trata das péssimas condições do prédio da Amador Bueno, como a marquise “do lado de fora do prédio, onde uma estrutura de madeira improvisada serve de rede de proteção para os fragmentos que possam vir a despencar” (creio que ficaria melhor conter os fragmentos e proteger as pessoas).

 

Em seguida, a matéria trata das dependências das novas instalações, em torno de um terço do espaço atual. A essa questão, pelo menos no texto publicado, o coordenador da Secult responde com a contratação de quatro funcionários e a aquisição de mais três computadores.

 

Outro ponto que a reportagem destaca é a troca de um imóvel público por outro alugado. Agora quem responde é o secretário Carlos Pinto, dizendo que a prefeitura de Santos não tem imóvel próprio para sediar a biblioteca. Ele não fala sobre a manutenção ou não de um prédio central, de referência, mas adianta que estuda a implantação de um sistema de unidades menores interligadas, sem também avisar quando a coisa vai sair do papel ou quando a casa da biblioteca vai deixar de ser provisória. Tomara que ele não repita o governo federal que tanto critica ao tornar permanente a situação itinerante da Biblioteca Municipal, nossa CPMF literária.

 

Lembro de uma audiência do Fórum da Cidadania de Santos com o ainda vice-prefeito João Paulo Tavares Papa para tratar do destino da Hospedaria dos Imigrantes. Eu estava lá e lembro dos técnicos da prefeitura apresentando desenhos e projetos para levar para a Hospedaria a sede da Biblioteca. Ainda que a Hospedaria esteja hoje com a Universidade Federal, campus Baixada, creio que o secretário conheça o assunto e que dali possam ser extraídas soluções ou pelo menos dicas do que se fazer com o acervo municipal.

 

III

Na terceira parte da reportagem, o jornal mostra a história da Biblioteca Municipal. Pena que é aquela história dos decretos e das leis que autorizam isso ou aquilo ou dão nomes oficiais para as coisas. Caberia aí uma história do acervo, dos livros raros, das grandes doações privadas e até das perdas e acidentes, mas só sabemos que o núcleo inicial foi montado com a compra da biblioteca pessoal do jornalista Alberto Sousa, morto em 1927. Para quem não sabe, Alberto Sousa foi contratado pela Câmara Municipal no início de década de 1910 para rebater na imprensa as acusações de Saturnino de Brito quanto à demora do poder legislativo em aprovar sua proposta de planta urbana para a cidade (leiam A peleja entre Saturnino de Brito e a Câmara Municipal de Santos).

 

IV

Quem não gostou da provisoriedade, da falta de centro e do uso de um imóvel particular para a Biblioteca Pública foi o escritor Flávio Viegas Amoreira. Em contato com o Porto Literário ele destaca o papel simbólico exercido pela biblioteca central em qualquer cidade: “É o caso da Mário de Andrade em São Paulo e a própria Biblioteca de Cubatão, que fica num prédio que já foi a sede da prefeitura”.

 

Epílogo

O romance Navios Iluminados é um exemplo de como buscamos nas obras literárias informações sobre os locais, no caso o porto de Santos. É o espaço na literatura. A equação se inverte no caso da biblioteca sem destino e aí vemos claramente a literatura no espaço; e são os espaços garantidos aos livros que demonstram o apreço de uma comunidade pela literatura.

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