O Museu da Imagem e do Som de Santos (Miss) apresentou no último sábado o documentário Viva Cassiano, dirigido por Bernardo Bernardes, sobre o crítico, professor, poeta e dramaturgo santista Cassiano Nunes. A sessão foi promovida pelo site Artefato Cultural, junto com a Mirante e VPD. Aproveitando que o nome do intelectual correu na cidade nesses dias, Porto Literário traz aqui um relato do próprio Cassiano sobre o Porto de Hamburgo, escrito após viagem que fez pela Alemanha em 1955 graças a uma bolsa de estudos.
O Porto ocupa uma área de 75 km², o que representa
um décimo da superfície total de Hamburgo
O texto que trata de Hamburgo está no volume Sedução da Europa, no qual o autor reúne suas impressões sobre o país de Goethe, além de Suíça, Itália, França e Portugal. Sobre Hamburgo, a descrição começa assim:
Hamburgo fica situada no fim do estuário do Elba, a 100 quilômetros do mar. O centro da cidade é embelezado por dois pequenos lagos: o Binnenalster e o Aussenalster. A suas docas são enormes, e impressionam pela quantidade de sua maquinaria, e intenso movimento. Ao aproximar-se do cais, o navio em que viajamos, passou junto de estaleiros grandiosos.
Cassiano lembra que havia visto poucas ruínas na cidade, que tinha sido “bastante bombardeada” pela RAF, a força área britânica, durante a Segunda Guerra Mundial. Posteriormente, ele descreve as ruas largas e as avenidas amplas da cidade, seus parques verdejantes, vitrines bem decoradas, metrô e faixa de ciclistas. Em seguida, Cassiano se concentra na arquitetura da cidade, de seus prédios públicos (o Paço Municipal, o Teatro de Ópera e o Zoológico).
Mas a descrição se encaminha para o bairro portuário de Hamburgo, St. Pauli, que reúne as atrações das bocas, o que não parece muito bem ao viajante-crítico: “Cada grande cidade no mundo tem o seu bairro especial para o vício, sem contarmos as sucursais de todos os subúrbios...”.
Apesar de sua desaprovação, a descrição de Santi Pauli é vívida e colorida como o próprio bairro:
Hamburgo ganhou fama na Europa como centro de divertimentos... Seu celebrado bairro St. Pauli, antigamente lugar de marinheiros boêmios, constitui hoje uma extensa reunião de cabarés, bares, casas de espetáculos, prostíbulos e hotéis equívocos. Muitas luzes coloridas, cartazes, bandeiras, fotografias de nus presumivelmente artísticos, homens de libré à porta dos cafes-concerto a nos prometerem numa algaravia não sei que números sensacionais, uma confusão de músicas, a multidão curiosa senão excitada, – eis, num rápido bosquejo o bairro do prazer
Um amigo me contou um dia sobre uma trama que havia inventado na qual um grupo de jovens santistas, também na década de 50, acabariam conhecendo os Beatles logo ali nas “casas de espetáculos” de Hamburgo (Uma trama para trazer os Beatles para as bocas de Santos). Seria interessante que meu camarada inclua nesse enredo a passagem de Cassiano pela cidade portuária alemã.
Cassiano Nunes escreve Sedução da Europa ressabiado. Na apresentação da obra, ele diz que não estava animado em escrever mais um entre “tantos livros de narrativas de viagens”, ainda mais quando percebia que os turistas se moviam mais por curiosidade do que por apetite cultural. Daí que parte o aviso:
De igual modo que para a maioria dos turistas patrícios, Paris não passa de um amontoado de casas velhas, ou numa reunião pitoresca de cabarés e conventilhos. É uma tolice pensar que as viagens instruem... as pessoas que saíram de sua terra, sem preparo. Nesse caso, disse sensatamente alguém, os marinheiros seriam muito instruídos... Com turismo desse tipo, mascarado de cultural, o Brasil tem desequilibrado muito as suas finanças. E esses turistas nacionais não chegam em nossa terra mais instruídos. Pelo contrário: retornam mais pretensiosos e confusos.
Epílogo
O site www.vivacassiano.com.br, além de informações sobre o documentário, traz ainda a bibliografia do autor, fotos e transcrição de alguns de seus poemas.
Referências
Cassiano Nunes. Sedução da Europa. São Paulo: Saraiva, s/ data.
